Saúde mental dos jovens brasileiros na pandemia

Impacto do isolamento na vida social, estudantil e empreendedora da juventude brasileira

Por Imarlan Gabriel, Natália Xavier, Lícia Priscila, Lucas Araújo e Theresa Ebrahim

A pandemia do novo coronavírus já dura vários meses e, durante esse período, a liberdade e o convívio social foram limitados para todos, principalmente, para os jovens. No entanto, a solidão causada por essas restrições levantou outra preocupação: a saúde mental dos jovens na pandemia. Ansiedade, estresse, tristeza e até depressão são alguns dos efeitos de uma situação de isolamento social. Somada a estes fatores, manter uma rotina de estudos, aulas virtuais, preparação para provas, entre outras atividades escolares, tem sido um desafio para estudantes. O cuidado com o bem-estar psíquico deve ser levado a sério. Contudo, nesta nova realidade pandêmica, muitas vezes, foi deixado de lado.

Vídeo: Hospital Israelita Albert Einstein
PESQUISAS

Durante a pandemia de covid-19, metade dos jovens sentiu impactos na saúde mental, segundo a pesquisa divulgada no dia 1 de setembro de 2021 pelo laboratório Pfizer. Segundo o estudo, 39% das pessoas na faixa de idade entre 18 e 24 anos disse que a saúde mental ficou ruim no período e 11% responderam que ficou muito ruim. A pesquisa foi realizada pela Inteligência em Pesquisa e Consultoria (Ipec) e ouviu 2 mil pessoas na cidade de São Paulo (SP) e nas regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Curitiba e Salvador.

Vídeo: TV Brasil

Entre os dias 21 e 22 de setembro de 2021, foi realizada uma pesquisa online na Universidade Federal de Alagoas (UFAL) para consultar a opinião e analisar a saúde mental dos jovens estudantes da instituição de ensino. Cerca de 50 pessoas participaram da pesquisa. Entre elas, 52% dos indivíduos apontaram que estão tentando sobreviver e superar este momento caótico causado pela pandemia. Dentre estes, 48% consideram que a sua saúde mental está em estado regular. Entretanto, 28% dos entrevistados afirmam que ficam deprimidos por mais de duas semanas. Além disso, 74% alegam que tentaram manter a cabeça ocupada durante a pandemia. Por fim, outros 50% dos jovens que participaram da pesquisa, dizem que não possuem nenhum tipo transtorno mental. Mediante os dados da pesquisa, a saúde mental de vários jovens foi afetada de modo negativo pelo isolamento social. Todavia, muitos destes estão tentando se manter estáveis psicologicamente.

ESPECIALISTA

Segundo o psiquiatra e pesquisador da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Michel Haddad, a pandemia contribuiu para expor um aumento dos casos de transtorno mental que já era percebido nos anos anteriores.

“A pandemia escancarou esse problema, mas isso já vinha acontecendo de longa data, especialmente nas últimas duas décadas”

O médico explica que os transtornos mentais, sendo a depressão um dos mais comuns, estão ligados a uma série de fatores, desde a pré-disposição genética até questões do meio onde a pessoa vive. Por isso, Haddad enfatiza a importância de uma atenção especial a grupos mais vulneráveis:

“Os ambientes competitivos, a desigualdade social, as minorias étnicas, as populações que têm estado de vulnerabilidade social ou os grupos mais vulneráveis: idosos e adolescentes, todos esses são, infelizmente, a população mais afetada”

Para Haddad, mesmo após o fim da pandemia, os efeitos desse momento na saúde mental da população devem permanecer por algum tempo.

“Mesmo depois de um controle dessa questão sanitária, dos índices de infecção, nós ainda vamos viver os impactos dessa pandemia nos transtornos mentais”


A SAÚDE MENTAL DOS JOVENS ESTUDANTES NA PANDEMIA

A educação foi uma das áreas mais atingidas pela pandemia do novo coronavírus (Covid-19) no Brasil. Com a migração do ensino presencial para o on-line e o estresse causado pelo medo da doença e o possível não aproveitamento do conteúdo pedagógico podem influenciar negativamente na saúde mental dos jovens estudantes.

Foto: Unsplash
PESQUISA

De acordo com os dados da 2ª pesquisa de adoção de aulas online apresentados no dia 19 de agosto de 2021, pelo Sindicato das Mantenedoras do Ensino Superior do estado de São Paulo (Semesp), 91,1% dos estudantes de ensino superior particular e 94,2% dos estudantes de instituições públicas relataram ter tido problemas de saúde mental durante a pandemia e dificuldades para se concentrar nas aulas remotas. O levantamento foi realizado em maio deste ano com mais de 2.900 alunos e 466 docentes de todo o Brasil.

O diretor executivo do Semesp, Rodrigo Capelato destaca que o modelo atual de aulas remotas atrofiou as habilidades sociais dos estudantes. Um sintoma disso é que 32,8% dos alunos disseram que nunca abriram a câmera nas aulas e que por isso essa volta ao presencial terá que ter acompanhamento psicológico por parte das instituições de ensino.

Foto: GETTY IMAGES
ESPECIALISTA

De acordo com o médico psiquiatra e professor da UEMS (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul), André Veras, os impactos na saúde mental dos estudantes são inevitáveis, mas há como diminuir o estresse causado pela pandemia.

“O primeiro ponto é a comunicação, isso tem aparecido como muito potente no esclarecimento das informações, nos esclarecimentos das propostas, em uma conversa mais horizontal com os acadêmicos que os permitam entender que há um período de adaptação tanto do corpo docente como da instituição, como deles, para a lida com essa situação e para a redução dos danos pedagógicos que essa situação toda produz”

Segundo o psiquiatra, durante a pandemia professores e alunos buscam compensar uma possível queda na qualidade do ensino devido à migração para a educação a distância. O esforço, no entanto, pode causar ainda mais ansiedade e estresse.

“É nesse momento de uma resposta mais ansiosa a essas dificuldades, com excesso, que acaba se produzindo um estresse acadêmico, um sofrimento ligado ao contexto pedagógico especificamente e que vai retroalimentando uma ansiedade, uma insegurança, experiências de insuficiências e de incapacidades”

O sinal de um adoecimento mental também pode ser identificado no comportamento em relação aos estudos, por exemplo, com a desorganização do processo educacional.

“No momento em que isso caminha para uma desorganização desse acadêmico na relação com uma experiência nova e a distância de ensino, produzindo sofrimento, produzindo muitas vezes desinvestimento e até uma desorganização do cotidiano, é que se passa a ser necessário identificar sinais de um adoecimento psicológico”

Para o professor, o corpo docente deve ficar atento aos sinais e oferecer apoio ao estudante.

“Essa situação precisa ser reconhecida e apoiada muitas vezes pela própria academia, no sentido de orientar pedagogicamente aquele aluno e quebrar esses ciclos, essas espirais de conhecimento”


O IMPACTO DA TECNOLOGIA NOS JOVENS NA PANDEMIA

O isolamento social agravou um dos problemas mais comuns da modernidade: a dependência tecnológica. Confinado em quatro paredes, muitos jovens veem a internet como uma forma de se distrair da realidade complexa e a única opção de comunicação com o mundo exterior. A maioria das plataformas e aplicativos de mídia social foram intencionalmente projetados para prender a atenção dos usuários, sobretudo, os jovens, o máximo de tempo possível. O excesso de tecnologia faz com que os jovens passem a maior parte do tempo interagindo virtualmente, o que afeta o desenvolvimento e faz perder outras experiências sociais importantes.

Foto: UFJF
PESQUISAS

O Laboratório Delete-Detox Digital e Uso Consciente de Tecnologias, da Universidade Federal do Rio De Janeiro (UFRJ) realizou uma pesquisa que evidencia essa dependência. Realizado no período de 1º de novembro de 2020 a 1º de janeiro de 2021, o estudo mostra que 62,5% das pessoas usaram tecnologias por mais de três horas todos os dias, e 49,1% por mais de quatro horas, durante o período de isolamento social imposto pela pandemia da Covid-19.

Outra pesquisa, desta vez, sob responsabilidade da psicóloga doutora em saúde mental Anna Lucia Spear King, mostra outros dados interessantes sobre essa dependência: 44,3% frequentemente se sentiam mais felizes durante o dia por usar as tecnologias, enquanto 26,8% se diziam tristes por não poderem usá-las. Já 17,3% relataram algum medo ao perceber que não tinham acesso às tecnologias e 29,5% ficavam nervosos.

Vídeo: TV Mar Canal

ESPECIALISTA

Segundo o psicólogo clínico Gilberto Godoy as emergências pandêmicas criaram novas necessidades e mudaram a maneira como as pessoas se conectam com tudo ao seu redor. Por exemplo, o uso irrestrito de tecnologia tornou-se um dos principais fatores que levam ao aparecimento ou agravamento de problemas mentais.

“A forma de o homem se relacionar com outros homens e com as coisas se modificou muito. Dentro do consultório, notei que as pessoas começaram a ter alguns sintomas que, antes, ou eram mascarados ou não existiam, como ansiedade, síndrome do pânico e depressão”

Godoy considera que é preciso ter hábitos saudáveis, e o pontapé inicial para lidar com o vício em tecnologia é reconhecer a existência do problema e buscar ajuda profissional. Segundo o psicólogo, o segredo para evitar danos à saúde é praticar o autocontrole e o uso consciente da tecnologia. 

“Com a dosagem certa, com equilíbrio de uso, a tecnologia pode ser benéfica em vários sentidos. O problema é que ter autocontrole não é fácil e, por isso, é importante ter a orientação de práticas terapêuticas”


A SAÚDE MENTAL DOS JOVENS EMPREENDEDORES NA PANDEMIA

Por conta das medidas de isolamento social para combater a Covid-19, o contexto financeiro e econômico mundial teve que reavaliar, renovar e adaptar as ideias de trabalho e geração de renda que foram afetadas pela pandemia para o novo contexto mundial. Nesta situação, muitos jovens começaram a desenvolver ideias para empreender em negócios de vários ramos. Com as redes sociais como uma grande aliada para as vendas, eles readaptaram a forma de empreender e começaram a se basear em seus conhecimentos nas mídias sociais.

Vídeo: Balanço Geral Oeste
PESQUISAS

Dados do Governo Federal divulgados em 2020, mostram que o número de microempreendedores individuais (MEIs) no país cresceu 14,8%, na comparação com o mesmo período de 2019. Uma estimativa feita pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) mostrou que aproximadamente 25% da população jovem e adulta estavam envolvidos na abertura de um novo negócio ou com uma empresa com até 3,5 anos de atividade.

Um estudo realizado pelo startup Troposlab e pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) apresenta que 76% dos empreendedores se sentiam afetados pela pandemia e 15% iniciaram uso de medicamentos. Também, mostra que 6% dos empreendedores apresentaram níveis severos dos sintomas de estresse, ansiedade e depressão. Isso pode significar cerca de 3 milhões de empreendedores em níveis graves de sofrimento psicológico. Além disso, o estudo também revelou que entre sua amostra, 13,8% dos empreendedores já receberam, ao longo da vida, algum diagnóstico de depressão e 50,7% disseram o mesmo para diagnósticos de ansiedade.


A IMPORTÂNCIA DA SAÚDE MENTAL DURANTE A PANDEMIA

Foto: Jaleko Artmed

Depois de tantos meses de pandemia da Covid-19, a saúde emocional de muitos jovens foi afetada de maneira profunda. O direito de ir e vir limitado, associado às normas de distanciamento social recomendadas pelo governo e a preocupação com o futuro, causaram um aumento significativo no percentual de jovens que desenvolveram algum tipo de transtorno psicológico, como ansiedade, depressão e ataques de pânico.

Podcast: Educa Floripa

A alteração brusca de rotina provocada pelo isolamento social, levou muitas famílias, profissionais e estudantes a sobrecarga e ao excesso de estresse. A necessidade de conciliar home office, aulas remotas, tarefas domésticas, cuidado com os filhos ou irmãos menores, animais de estimação, pais ou companheiros deixou muitos jovens e adultos sobrecarregados. Por isso, ficar sempre atento às pautas de discussão sobre saúde mental é de extrema importância e é a melhor forma de mantê-la em dia durante o momento difícil que a sociedade está vivendo.

Vídeo: Ciclo Saúde
ESPECIALISTAS

Segundo a dra. Camila Leon, doutora e mestre em Distúrbios do Desenvolvimento pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), o estresse e a ansiedade mais que dobraram durante a pandemia e o quadro de depressão tende a se agravar.

De acordo com os dados da OMS, a depressão deve se tornar a doença mais comum do mundo até 2030. Por isso redobrar a atenção e o cuidado com a nossa saúde mental e a das pessoas à nossa volta é essencial

A especialista Andréa Duarte Pesca, coordenadora do curso de especialização em Avaliação Psicológica da Faculdade Cesusc comenta o seguinte:

“Do dia para a noite, tivemos que nos afastar socialmente e mudar a nossa rotina, adaptar-nos para um contexto de incertezas. Isso afetou muitas pessoas, e até mesmo aquelas que nem pensavam em questões como estresse, ansiedade e depressão. Esses três fenômenos estão bastante em evidência nesses quase dois anos de pandemia”

De acordo com a psicoterapeuta Sarah Kendrick, em uma matéria feita pelo BBC NEWS:

“O isolamento significa cortar o contato presencial, mas não é preciso cortar toda a comunicação. Na verdade, é mais importante do que nunca conversar, falar e ouvir, compartilhar histórias e conselhos, e ficar em contato virtual com as pessoas que importam para você”

Vídeo: Jairo Bouer

Pensando neste assunto, o Conselho Nacional do Ministério Público ofertou uma cartilha chamada “Bem Viver” que retrata pontos sobre a saúde mental e está disponível para baixar. Neste arquivo, estão recomendações e frases de incentivo, para quem estiver interessado em continuar a leitura sobre o tema.

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